18/08/2025

Protoginia e protandria em híbridos de milho

 
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Protoginia e protandria em híbridos de milho

O que são e qual o impacto no campo?

•  No trabalho diário com a cultura do milho, sabemos que detalhes genéticos muitas vezes explicam o que vemos na lavoura. Entre esses detalhes, dois termos podem surgir em conversas mais técnicas: protoginia e protandria. Mas o que eles realmente significam? E mais importante: como impactam a produtividade e o desempenho dos híbridos?

Entendendo os termos: protoginia e protandria

•  O milho é uma planta monoica, ou seja, possui flores masculinas (pendão) e femininas (espiga) na mesma planta, mas em estruturas separadas. Essa característica permite a reprodução tanto por polinização cruzada (entre flores diferentes) quanto por autopolinização (entre flores da mesma planta). A sincronia entre a liberação de pólen (masculino) e a receptividade do estigma (feminino) é fundamental para a polinização e formação de grãos.

•  Protoginia ocorre quando a espiga (parte feminina) fica receptiva antes do pendão liberar o polén (Foto 1).

•  Na protandria, o pólen é liberado antes da espiga estar receptiva (Foto 1).

Foto 1: Protoginia e protandria em milho | Fonte: imagem gerada por IA.
Foto 1: Protoginia e protandria em milho | Fonte: imagem gerada por IA.

 

•  Embora ambos os termos indiquem uma assincronia entre os órgãos reprodutivos, a protandria é a forma mais comum nos híbridos modernos e, de forma geral, os híbridos comerciais têm uma diferença média de 2 a 3 dias, considerada aceitável para garantir boa polinização na maioria das condições de cultivo.

Por que a sincronização da polinização é tão importante

•  A sincronização entre a liberação do pólen pelo pendão e a receptividade dos estilos-estigmas na espiga é um dos pontos-chave para garantir uma boa fecundação e, consequentemente, a formação de grãos.

•  Quando há uma assincronia entre esses dois eventos reprodutivos, o resultado pode ser a falha na polinização de parte ou até mesmo de toda a espiga, o que afeta diretamente o número de grãos e o rendimento final da lavoura.

•  Os estilos-estigmas permanecem receptivos ao pólen por cerca de 6 a 8 dias após sua emissão, enquanto o pólen liberado pelo pendão tem viabilidade média de apenas 15 a 30 minutos após sua liberação, especialmente em condições de baixa umidade relativa e altas temperaturas.

•  Essa descoordenação pode ocorrer tanto por questões genéticas do híbrido quanto por condições ambientais adversas, como estresse hídrico, altas temperaturas ou excesso de adubação nitrogenada. Por isso, entender como e quando ocorre essa assincronia, é essencial para ajustar o manejo e preservar o potencial produtivo da lavoura.

Entendendo a protoginia e seus impactos

•  Apesar de muitas vezes associada a falhas na polinização, a protoginia moderada pode ser uma vantagem adaptativa importante, especialmente em ambientes com estresses abióticos durante o florescimento, como calor e seca.

•  Em cenários em que o milho sofre déficit hídrico no período reprodutivo, a planta pode interromper temporariamente o crescimento vegetativo para preservar a energia destinada à reprodução. Nesses casos, uma espiga que emite os estilos-estigmas antes da liberação do pólen (protoginia) tem a oportunidade de “esperar” pela chegada do pólen de maneira mais eficiente.

Estudos mostram que:

a) A protoginia de 2 a 3 dias permite que, quando o pólen for finalmente liberado — mesmo que de forma reduzida ou tardia por causa do estresse — os estilos ainda estejam receptivos.

b) Isso aumenta a janela de fecundação, o que é crucial em ambientes de baixa disponibilidade hídrica, onde a viabilidade do pólen é bastante reduzida (muitas vezes não ultrapassando 30 minutos em campo seco e quente).

c) Além disso, essa característica pode favorecer a polinização cruzada em plantios escalonados ou em áreas com híbridos com alta produção de pólen, elevando a taxa de fecundação mesmo em condições adversas.

Quando a protoginia se torna um fator limitante?

•  A protoginia se torna um fator limitante à produtividade quando o intervalo entre a receptividade dos estilos-estigmas e a liberação de pólen é excessivamente longo, ultrapassando a capacidade de espera dos tecidos reprodutivos. Em condições normais, os estilos permanecem receptivos por até 6 a 8 dias, mas em ambientes muito quentes e secos, esse período pode ser encurtado para menos de 5 dias. Quando o pendão atrasa significativamente sua emissão ou quando há baixa produção de pólen — seja por falhas fisiológicas, estresses ou até competição por recursos — a fecundação se torna incompleta.

•  Esse cenário é especialmente prejudicial em áreas com alta fertilidade (como em lavouras com doses elevadas de nitrogênio), que podem promover um desenvolvimento descompassado entre espiga e pendão. O resultado visível no campo são espigas com falhas na base, onde a polinização deveria ocorrer primeiro, comprometendo o número final de grãos por fileira. Em casos mais severos, observa-se até espigas “vazias” — completamente improdutivas — se o pólen não estiver disponível no momento adequado.

•  Além disso, a protoginia acentuada pode ser amplificada em ambientes com altas densidades de plantio, estandes irregulares, situações de baixa luminosidade que afetam o desenvolvimento do pendão ou ainda em ambientes com muita chuva durante a polinização. Por isso, quando mal posicionada ou não considerada nas recomendações técnicas, a protoginia deixa de ser uma aliada e passa a representar um risco agronômico importante.

•  Portanto, a protoginia não é, por si só, um problema genético, mas sim uma característica fisiológica que deve ser entendida dentro do contexto ambiental e de manejo.

O que devemos considerar?

•  Observar o histórico da área: solos muito férteis ou com histórico de alto aporte de nitrogênio tendem a intensificar o alongamento entre pendão e espiga.

•  Monitorar o florescimento: acompanhar a liberação de pólen e a emissão de estilos-estigmas pode ajudar a entender a sincronia do híbrido em sua região.

•  Consultar o posicionamento técnico do híbrido: cada material responde de forma diferente ao ambiente. Híbridos com maior grau de protoginia costumam ter posicionamento técnico específico.

•  Além disso, híbridos com maior produção de pólen (alta densidade de espigas/planta) ou que sejam usados em plantios escalonados podem compensar essa assimetria natural.

•  Mesmo em híbridos que apresentam certo grau de protoginia, o potencial produtivo pode ser altíssimo. Um estudo da Embrapa Milho e Sorgo mostrou que, quando bem manejados, híbridos com até 4 dias de protoginia mantiveram índices de produtividade superiores a 9.000 kg/ha, desde que a disponibilidade hídrica fosse controlada e o estande de plantas mantido uniforme.

Conclusão

Compreender o comportamento reprodutivo dos híbridos, especialmente no que diz respeito à protoginia e à protandria, é essencial para um manejo eficiente e produtivo da lavoura de milho. Essas características não devem ser vistas isoladamente como problemas, mas sim como fatores que interagem com o ambiente, o manejo e o posicionamento técnico do híbrido. Identificar a presença de protoginia, entender seu grau e avaliar o contexto da área — como fertilidade, estresse hídrico e densidade de plantio — permite ao produtor tomar decisões mais assertivas. Afinal, o sucesso no campo está em aliar o potencial genético das sementes ao conhecimento técnico e à prática agronômica de precisão.

Autora: Ana Flávia Ribeiro, agrônoma de campo Pioneer®.

Referências

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